Quando vinha da escola
pelo atalho do costume, um caminho que cortava pelo meio de um terreno meio
selvagem que no inverno ficava empapado de lama, o Pedro deu com um pedregulho
que não lhe era familiar naquele sítio. Das tantas e tantas vezes que por ali tinha
passado já conhecia todas as pedras do caminho, ao ponto de quase as tratar
pelo nome. Com algum esforço, revirou-o
e deu com uma data de maços de notas de 500 euros. Nunca tinha visto sequer uma
nota de quinhentos, quanto mais uma quantidade destas. De quem seria aquele
dinheiro? Quem o teria ali deixado? Quanto é que estaria ali no total? Uma
fortuna, certamente.
Olhou para um lado e
outro para ver se não vinha ninguém e se não estava a ser observado. Agachou-se
e colocou a sua mochila ao lado dos maços. Começou então a empurrá-los para o
seu interior.
Depois de tudo muito bem
arrumado, o Pedro seguiu pelo seu caminho habitual, em direção a casa. Com os
fones nos ouvidos, tentava o seu melhor para evitar pensar na pesada quantidade
de dinheiro que guardava consigo dentro da mochila.
Mas era tão difícil… No
meio de um turbilhão de pensamentos, entendeu que estava mais perto ainda do
que pensava de chegar ao seu destino. E no fim, de tão distraído que ia, a
pensar em não pensar, quase foi atropelado por um carro que passava na rua. A
passadeira estava claramente à sua frente, mas ia tão distraído que até se esqueceu
de ver se vinha algum carro para poder no fim atravessar a rua. O susto, pelo
menos, pareceu trazê-lo de volta à realidade. Talvez isso tivesse acontecido
devido à buzinadela estridente que ouviu, ou talvez pelo olhar fixo do condutor
que não saía de cima dele, mesmo depois de Pedro ter atravessado a passadeira e
ficar mais e mais perto de casa.- Mas que mal disposto… - murmurou o rapaz.
Apesar do susto, o Pedro
continuou absorvido nos seus pensamentos. Que atitude iria ter quando chegasse
a casa? Contava aos pais? Guardava o dinheiro num lugar seguro ou entregava-o
simplesmente à polícia? Tantas questões e nenhuma resposta.
Com estas dúvidas na sua
cabeça, o rapaz relembrou o olhar fixo do condutor, não imaginando sequer que
este o continuava a perseguir. Ao chegar a casa e estando sozinho, foi a correr
para o quarto, fechando a porta. Sentou-se na cama, abriu a mochila e retirou o
dinheiro de dentro dela, arregalando os olhos:- Onde irei guardar este dinheiro
todo? Não me recordo de ter apanhado tanto. Fixando o olhar no monte de
dinheiro, decidiu ir buscar uma folha e uma caneta, para fazer uma lista das
ideias que tinha, mas eram tantas que não sabia por onde começar.
Sentou-se em frente à
secretária e rapidamente começou a passar para o papel todas as ideias que lhe
surgiam:
• “Fazer uma viagem pelo
mundo;”
• “Ajudar a minha
família;”
• “Ter uma grande
casa...”
Estava de tal forma
contente que até parecia uma criança dentro de uma loja de doces.
A excitação era tanta,
devido à possibilidade de puder vir a concretizar todos os seus sonhos, que até
se esqueceu que ainda tinha que resolver um problema: onde iria esconder as
notas?
De repente veio-lhe à
memória a imagem do condutor que quase o tinha atropelado. Sentiu um arrepio.
Algo lhe dizia que aquele homem não era boa pessoa.
Pedro pensou, pensou,
voltou a pensar, e não lhe ocorria nenhuma ideia de onde guardar o dinheiro. Olhou
para um lado e para o outro, e de repente fez-se um "clique" na
cabeça dele. Deitou um olhar fixo ao urso de peluche e teve uma ideia
brilhante:
- Ainda bem que a avó me
ensinou a coser.
Rapidamente descoseu o
peluche e substituiu o algodão pelas notas. Coseu o urso e pensou que assim
ninguém iria saber de nada.
À hora do jantar, quando
já estavam todos sentados à mesa, a mãe perguntou-lhe:
- Depois podes levar-me
aqueles bolinhos ao novo vizinho?
- Estás sempre a dar
coisas aos outros, mãe. Já viste que ninguém te dá nada? - disse ele.
A mãe, estupefacta com a
resposta do filho, disse logo:
- Eu não faço isto para
me darem algo em troca, Pedro! E fico muito triste que penses assim, porque não
foi essa a educação que te dei.
Quando acabou de comer,
Pedro foi a casa do novo vizinho. Tocou à campainha e, para seu espanto, quem
abriu a porta foi o condutor que quase o tinha atropelado.
O homem reconheceu-o mas
nada disse, e Pedro, nervoso, ia deixando cair os bolinhos.
Mal sabia ele que tinha
sido visto pelo seu novo vizinho a empurrar as notas para dentro da mochila e
que, numa tentativa de ficar com o dinheiro, este o tentara atropelar.
Quando foi para casa,
contou à mãe que tinha encontrado todas aquelas notas. Ela achou por bem que
ele as fosse entregar à polícia, conselho que decidiu seguir. No entanto, ao
sair de casa foi visto pelo vizinho a transportar o peluche, que achou a atitude
muito estranha para um rapaz daquela idade e por isso decidiu segui-lo.
Sem saber que o
perseguiam, Pedro ia apressadamente em direção à polícia, para entregar todo
aquele dinheiro que estava escondido no peluche. O seu vizinho estava atento a
cada passo dele, esperando o momento certo para o surpreender e roubar-lhe o
peluche.
Àquela hora da noite,
quando seguia por um caminho escuro, Pedro olhou para trás e reparou que estava
a ser seguido por alguém. Por isso resolveu correr para chegar mais depressa à
polícia e ver-se livre daquele dinheiro. Com a intenção de o roubar, o homem
começou também a correr, e conseguiu ultrapassá-lo e bloquear-lhe o caminho.
Foi então que, com um ar maléfico, disse:
- Apanhei-te!
- O que é que o senhor
quer? - disse Pedro, com um ar assustado.
- Onde é que está o
dinheiro? – perguntou o novo vizinho, agarrando-o pelo braço.
- Eu não sei do que é
que o senhor está a falar! Tire as suas mãos de cima de mim!
Mostrando-se determinado
em roubar o peluche, o vizinho atirou-o ao chão. No meio de tanta
agressividade, Pedro não conseguiu deter o homem, e assim, este conseguiu o que
queria. Satisfeito, correu em direção ao carro, deixando o rapaz no chão, de
mãos a abanar. Este, triste e furioso, pensou em continuar o caminho até à
esquadra e participar o roubo, mas a insegurança e o medo de que ninguém
acreditasse nele era tanto que decidiu regressar a casa, determinado a contar
tudo à mãe. Contudo, para sua surpresa esta não acreditou nele, achando que
estava a mentir só para ficar com o dinheiro e que o escondera nalgum sítio
antes de chegar a casa.
Muito aborrecido com
esta reação, Pedro não era capaz de acreditar, já que tudo lhe estava a correr
mal, e naquele momento só pensava em vingar-se do vizinho. Por tudo isto,
decidiu tomar medidas mais drásticas e foi visitar o seu amigo Bruno, com a
intenção de ver se, juntos, conseguiam imaginar um plano para conseguir
resgatar o dinheiro e fazer com que a mãe acreditasse nele.
No meio de tantos
pensamentos, Pedro imaginara como seria se ambos, ele e o seu amigo, entrassem
às escondidas em casa do novo vizinho e conseguissem resgatar o urso de
peluche. Pedro já conhecia o jardim da parte de trás da sua casa, sabendo
exatamente por onde entrar e como, e tinha em mente um plano que, a seus olhos,
parecia ser o mais rápido e eficaz: entrar pela janela da cave do vizinho,
subir para o andar de cima, procurar o urso de peluche e fugir. Talvez fácil
demais, pensaram eles.
- O problema é: como
vamos tirar o vizinho de dentro de casa? – perguntou o Bruno.
- Não sei, ele costuma
estar sempre em casa. A minha mãe está sempre a pedir-me para ir oferecer-lhe
bolinhos, e a nós nunca nos dão nada, – desabafou o Pedro.
- Eventualmente vai ter
que dar agora: o urso de peluche! – exclamou o Bruno.
Depois de algum tempo a
pensar como entrar sem serem vistos, decidiram estudar o horário do vizinho
durante dois dias. A que horas saía, para onde ia, durante quanto tempo ficava
fora e a que horas voltava. Depois de terem estudado bem o horário, tomaram
então a resolução de criar um plano, mas, atrás da porta do quarto de Bruno, a
sua mãe ouvira tudo, e abrira a porta de repente, olhando de maneira
desconfiada, e preparando-se para dizer qualquer coisa.
Quando o Pedro e o seu
amigo Bruno decidiram ir espiar o vizinho maléfico com o objetivo de roubar o
peluche que continha todo o dinheiro, descobriram que o homem era ainda pior do
que imaginavam… Quando estava quase a anoitecer, foram à socapa espreitar pela
janela, apesar do enorme medo de serem apanhados, até que Bruno exclamou:
- Pedro! Temos que ir
imediatamente embora! Este homem é completamente doido – dizia ele,
aterrorizado.
- Mas o que é que
aconteceu?
A cada palavra que saía
da boca do amigo, Pedro ficava sem reação possível… Ele tinha avistado corpos
espalhados pela casa, enquanto o vizinho maléfico afiava várias facas com um
olhar pérfido. Era um assassino em série.
Aterrorizados,
os dois amigos começaram a correr para longe da casa do homem, mas com tanta
pressa e receio não repararam no caixote do lixo no exterior da casa. Pedro
tropeçou, fazendo ressoar um barulho que se fez ouvir em grande parte da
vizinhança. Agora com ainda mais receio, após o Pedro se ter levantado
rapidamente, os dois voltaram a correr ainda mais apressados em direção à casa
do Pedro. Ao aproximarem-se da casa, o Bruno virou-se para Pedro e disse-lhe:
- Por agora vamos separar-nos. Vai para
casa e não olhes cá para fora. Eu vou a correr até minha casa.
- Está bem, tem cuidado. - Respondeu o
Pedro, e depois voltou-se e perguntou - O que fazemos em relação ao que
descobrimos?
- Por agora nada… Bem, tem cuidado. Ligo-te
quando chegar a casa.
Quando
o Pedro entrou em casa ouviu na televisão uma notícia sobre um
novo caso de mistério acerca de várias pessoas que tinham desaparecido.
[Continuação
escrita pelo Guilherme Dias]
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